Saudades, não! Boas lembranças, sim!

Grande parte da minha juventude foi vivida lá pros lados da Barra Grande, região bastante povoada nos anos 60, 70.  Digo sempre a  meus amigos que não tenho saudade de nada mas,  confesso que guardo lindas e curiosas recordações.  Em 1954, fui levado à escola pela minha mãe. Era o meu primeiro dia de aula naquela escolinha que ficava próximo à rodovia Mal Rondon.  Lá estudei três anos, porque a quarta série só existia aqui na cidade. Uma manhã,  logo após chegar à escola, travei luta corporal com Valter, um garoto primo de meu pai e meu colega de classe.
Por ele ser mais forte, eu estava levando a pior quando apanhei um pedaço de telha ameacei atirá-lo nele. A providencial intervenção de Lourival Parrela evitou que eu fizesse uma galo na cabeça do Valter. Porém, ao arrancar das minhas mãos o pedaço de telha, Lourival o atirou para longe e Mauricio Cavalheiro que não tinha nada a ver com a estória, teve que ser levado à farmácia para fazer curativo. A pedra o atingiu provocando um corte profundo na testa. Minha mãe, sempre muito prendada, dedicada e abnegada deu-me de presente logo no primeiro ano, uma bolsa de couro (guardo ainda o cheiro do couro) muito bonita.
Comprou ainda um lindo estojinho de madeira, lápis de cor, e outros materiais, tudo top de linha. Entre as casas da colônia da usina e a escola havia uma pinguela que servia de travessia do córrego Barra Grande. Era um pau roliço e um corrimão feito com uma vara de eucalipto amarrada. Um dia, ao passar pela pinguela, minha bolsa escapou de minhas mãos e foi levada pelas águas do rio.  Com a maior cara de pau cheguei em casa sem material escolar.
Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos garotos de minha geração era encontrar uma bola para organizar uma pelada. Quando não havia nenhuma, a gente fazia uma bola de meia e quebrava o galho com ela. Um dia, o Lelo (Ademir Archangelo Dalben) apareceu  com uma bolinha de capotão número três, amarelinha, quase oficial. Organizamos dois times, um com camisa e outro sem, e fomos para o centro do campo. Nas imediações dos vestiários que ficavam na parte de baixo do estádio assistia a tudo o grande Mané Mazini, que jogava no time principal da usina.
Ele pegou a bolinha do Lelo, foi até o centro do gramado e para experimentá-la, deu um bicudo na criança e ela acabou atingindo o tronco de uma paineira que havia atrás do gol dos fundos. Pobre bolinha, aguentou apenas um chute. Estourou no troco da paineira e nós, ficamos sem jogar a nossa pelada. Outra brincadeira muito em voga na minha época, era o pião. Quatro ou cinco garotos disputavam quem era melhor na “machadinha”, no “pinga-pinga”, no “duque” dentre outras brincadeiras. Zep Machado era, sem dúvidas, o melhor de todos.
Ele fazia o pião “dormir” facilmente e em outras oportunidades, rachava o brinquedo dos adversários. Num domingo à tarde, ele já havia arrebentado com a maioria dos piões quando Jair Vieira, um garoto meio fora do prumo,  apareceu com um facão de cortar cana, e num golpe certeiro partiu ao meio o brinquedinho de Zep. Uma pequena confusão se instalou, mas tudo se resolveu numa boa. Saudades, não! Boas lembranças, sim!

::.. Benedicto Blanco é jornalista, administrador do site Lençóis Notícias e membro da Academia Literária Lençoense (ALL).