Se máscara é obrigatória, por que não a vacina?

Não é preciso repetir aqui a tragédia com a perda de vidas, colapso econômico a nível familiar, nacional e mundial que a Covid-19 trouxe. Todavia, recordemos o pânico quando o vírus alastrou-se no Brasil e no mundo, diante da impossibilidade imediata de um horizonte de como deter ou controlar a profusão de óbitos alarmantes.

Até a descoberta da cura ou da vacina, muitas e muitas vidas estão sendo salvas por medidas profiláticas incluídas em planos regionais e nacionais que, felizmente, contiveram o crescimento ainda mais vertiginoso da Covid-19, como o distanciamento social, regras de higienização, condições obrigatórias veiculadas em legislação.

O uso das máscaras passou, efetivamente, a ter eficácia quando tornou-se obrigatório, meses após o início da pandemia (talvez ainda mais vidas fossem poupadas se a lei não demorasse em tornar obrigatório seu uso). A obrigatoriedade das máscaras e demais regras profiláticas atendeu à lógica democrática do interesse maior da coletividade prevalecer sobre o interesse individual.

Desde a Constituição Federal de 1988, o direito à saúde é uma garantia fundamental de todo cidadão, cuja base eleva-se pela adoção do princípio da dignidade da pessoa humana, como um dos fundamentos do Estado. O preâmbulo da Constituição da OMS define saúde como o “completo bem-estar físico, mental e social”. O breve resumo acima, a meu ver, já sustenta a existência de um escopo constitucional para a obrigatoriedade de condutas, no caso em proteção à saúde, a serem cumpridas pela coletividade, como ocorreu nas medidas mencionadas.

Nesta linha, por que a vacinação que pode banir do mundo uma praga tão letal como a Covid-19 deve ser excluída desta lógica constitucional? Por que as vacinas surgiram em pouco tempo? A rapidez somente corrobora a evolução da ciência, que felizmente atendeu à necessidade da humanidade neste momento. O Mini Sky City, prédio de 57 andares com 800 aptos na China, foi construído em 19 dias e nem por isso seus apartamentos deixaram de ser ocupados porque fugiu ao tempo normal da engenharia até então conhecida.

Os últimos eventos negativos (representativos) envolvendo vacinas por erros de fabricantes foram há pelo menos três décadas (poliomielite e vacinas BCG -tríplice viral-sarampo/caxumba/rubéola). Tais eventos motivaram mais investimentos e pesquisas para garantir maior segurança na fabricação. Portanto, dentre os riscos relacionados às vacinas, o mais grave é a não vacinação. Por último, criticável a polêmica que surgiu quanto à obrigatoriedade da vacina contra Covid-19. Há anos a vacinação das crianças é obrigatória, mesmo indiretamente, via restrição de benefícios (salário-família), acesso a matrícula em escola pública etc.

A mesma força obrigatória (relativizada) que ocorre até hoje, sem questionamentos de inconstitucionalidade, pode ser amoldada à vacinação contra a Covid-19, no caso para crianças e adultos (condição para obter benefícios sociais, financiamentos, bolsas, incentivos etc).

A condição não facultativa da vacinação contra a Covid-19 impõe-se como uma necessidade para garantir a vida em um mundo pandêmico. Aliás, a posição aplica-se a qualquer vacina contra doenças graves, considerando-se que o Brasil está voltando a ter doenças erradicadas, como sarampo, rubéola e difteria, pela redução do índice de adesão da população nas campanhas de vacinação contra tais doenças.

 

* O autor é advogado, sócio-fundador do escritório LF Maia Sociedade de Advogados.